Revista espírita — Jornal de estudos psicológicos — 1864

Allan Kardec

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Maio

Como é possível o conhecimento do futuro? Compreende-se as previsões dos acontecimentos que são consequência do estado presente, mas não dos que nenhuma relação têm com eles, e, ainda menos, dos que são atribuídos ao acaso. Diz-se que as coisas futuras não existem, que ainda estão no nada, então como saber se acontecerão? Contudo são muito numerosos os exemplos de predições realizadas, de onde concluir-se que aí se passa um fenômeno cuja chave não se tem, pois não há efeito sem causa. Essa causa, que tentaremos achar, ainda é o Espiritismo, ele próprio também chave de tantos mistérios, que no-la fornecerá e que, além disso, mostrar-nos-á que o próprio fato das predições não se afasta das leis naturais.

Como comparação, tomemos um exemplo nas coisas usuais, e que auxiliará a compreender o princípio que teremos de desenvolver.

Suponhamos um homem colocado no alto de uma montanha, considerando a vasta extensão da planície. Nessa situação, pouco será o espaço de uma légua, e facilmente poderá ele abarcar de um golpe de vista todos os acidentes do terreno, do começo ao fim da estrada. O viajante que por primeira vez percorre essa estrada sabe que caminhando chegará ao fim. Isto é simples previsão da consequência de sua marcha. Mas os acidentes do terreno, as subidas e descidas, os riachos a transpor, as matas a atravessar, os precipícios onde pode cair, os ladrões postados para o assalto, as hospedarias onde poderá descansar, tudo isto independe de sua pessoa. Para ele, o futuro é desconhecido, porque sua vista não vai além do pequeno círculo que o envolve. Quanto à duração, mede-a pelo tempo consumido em percorrer o caminho. Tirai-lhe os pontos de referência e apaga-se a duração. Para o homem que está na montanha e que acompanha o viajante com o olhar, tudo isto é presente. Suponhamos que esse homem desça até o viajante e que lhe diga: “Em tal momento encontrareis tal coisa; sereis atacado e socorrido.” Ele predirá o futuro. Para o viajante, isto é o futuro. Para o homem da montanha é o presente.

Agora, se sairmos do círculo das coisas puramente materiais e, por pensamento, entrarmos no domínio da vida espiritual, veremos esse fenômeno reproduzir-se em escala muito maior. Os Espíritos desmaterializados são como o homem da montanha. O espaço e tempo não existem para eles. Entretanto, a extensão e a penetração de sua vista são proporcionais à sua depuração e à sua elevação na hierarquia espiritual. Em relação aos Espíritos inferiores, eles são como um homem munido de poderoso telescópio, ao lado de outros que observam a olho nu. Nestes últimos a vista é circunscrita, não só porque dificilmente podem afastar-se do globo a que estão ligados, mas porque a grosseria de seu perispírito vela as coisas afastadas, como faz a névoa em relação aos olhos do corpo.

Compreende-se, pois, que conforme o grau de perfeição, um Espírito possa abarcar um período de alguns anos, de alguns séculos, e até de muitos milhares de anos, pois o que é um século em comparação com a eternidade? Diante dele os acontecimentos não se desenrolam sucessivamente, como os incidentes da estrada do viajante. Ele vê simultaneamente o começo e o fim do período. Todos os acontecimentos que nesse período são o futuro para o homem da Terra, para ele são o presente. Poderia ele, pois, vir dizer-nos com certeza: Tal coisa acontecerá em tal época, porque ele vê essa coisa, assim como o homem da montanha vê o que espera o viajor na estrada. Se ele não diz, é porque o conhecimento do futuro seria nocivo ao homem. Ele entravaria o seu livre-arbítrio; paralisá-lo-ia no trabalho que deve realizar para o seu progresso. O bem e o mal que o esperam lhe são desconhecidos a título de provação.

Se uma tal faculdade, mesmo restrita, pode estar nos atributos da criatura, a que grau de poder deve ela elevar-se no Criador, que abarca o infinito? Para ele o tempo não existe; o começo e o fim do mundo são o presente. Nesse imenso panorama, que é a duração da vida de um homem, de uma geração, de um povo?

Contudo, como o homem deve concorrer para o progresso geral, e certos acontecimentos devem resultar de sua cooperação, em certos casos pode ser útil que pressinta esses acontecimentos, a fim de lhes preparar o caminho e estar pronto para agir quando chegar o momento. Eis por que, às vezes, Deus permite seja levantada a ponta do véu, mas é sempre com um fim útil, e jamais para satisfazer uma vã curiosidade. Assim, essa missão pode ser dada, não a todos os Espíritos, pois alguns não conhecem o futuro melhor que os homens, mas a alguns Espíritos suficientemente adiantados para isto. Ora, convém ressaltar que essas espécies de revelações sempre são feitas espontaneamente, e jamais, ou pelo menos muito raramente, em resposta a uma pergunta direta.

Essa missão pode ser igualmente concedida a certos homens, e eis de que maneira.

Aquele a quem é confiado o trabalho de revelar uma coisa oculta pode recebêla, malgrado seu, por inspiração dos Espíritos que a conhecem, e então a transmite maquinalmente, sem se dar conta. Além disto, sabe-se que, quer durante o sono, quer em vigília, quer nos êxtase da dupla vista, a alma se desprende e possui em grau mais ou menos grande as faculdades do Espírito livre. Se ele for um Espírito adiantado, e principalmente se, como os profetas, tiver recebido a missão especial para esse efeito, ele goza, nesses momentos de emancipação da alma, da faculdade de abarcar, por si mesmo, um período mais ou menos extenso e vê como presentes os acontecimentos desse período. Então pode revelá-los imediatamente, ou lhes conservar a memória ao despertar. Se esses acontecimentos devem ser mantidos em segredo, ele perderá a sua lembrança ou deles conservará apenas uma vaga intuição, suficiente para guiá-lo instintivamente. É assim que se vê essa faculdade desenvolver-se providencialmente em certas ocasiões, como nos perigos iminentes, nas grandes calamidades, nas revoluções, e que a maioria das seitas perseguidas tiveram numerosos videntes. É ainda assim que se veem grandes capitães marcharem resolutamente contra o inimigo, com a certeza da vitória, bem como homens de gênio, como Cristóvão Colombo, por exemplo, perseguirem um objetivo predizendo, por assim dizer, o momento de atingi-lo. É que eles viram esse objetivo, que não é desconhecido para o seu Espírito.

Todos os fenômenos cuja causa era desconhecida foram reputados maravilhosos. Uma vez conhecida a lei segundo a qual se realizam, eles entraram na ordem das coisas naturais. O dom da predição não é mais sobrenatural do que uma grande quantidade de outros fenômenos, porque ele repousa nas propriedades da alma e na lei das relações entre os mundos visível e invisível que o Espiritismo vem dar a conhecer. Mas como admitir a existência de um mundo invisível, se não se admite a alma, ou se não se admite sua individualidade após a morte? O incrédulo que nega a presciência é consequente consigo mesmo. Resta saber se ele é consequente consigo mesmo em relação à lei natural.

A teoria da presciência talvez não resolva de modo absoluto todos os casos que a previsão do futuro possa apresentar, mas não se pode deixar de admitir que ela estabelece o seu princípio fundamental. Se não se pode tudo explicar, é pela dificuldade, para o homem, de colocar-se nesse ponto de vista extraterreno. Por sua própria inferioridade, seu pensamento, incessantemente arrastado para a senda da vida material, muitas vezes é impotente para se destacar do solo. A esse respeito, certos homens são como as aves novas, cujas asas, demasiadamente fracas, não lhes permitem elevar-se no ar, ou como aqueles cuja vista é demasiado curta para ver ao longe, ou, enfim, como aqueles a quem falta um sentido para certas percepções. Entretanto, com alguns esforços e com o hábito da reflexão, lá se chega, e os espíritas chegam mais facilmente do que os outros, porque melhor do que os outros podem identificar-se com a vida espiritual, que eles compreendem.

Para compreender as coisas espirituais, isto é, para fazer delas uma ideia tão clara quanto a que fazemos de uma paisagem que está aos nossos olhos, falta-nos, realmente, um sentido, exatamente como a um cego falta o sentido necessário para compreender os efeitos da luz, das cores e da visão à distância. Assim, só por um esforço da imaginação é que o conseguimos, auxiliados por comparações tiradas das coisas familiares. Entretanto, as coisas materiais só nos podem dar ideias muito imperfeitas das coisas espirituais. É por isso que não se deveriam tomar essas comparações ao pé da letra e crer, por exemplo, no caso de que se trata, que a extensão das faculdades perceptivas dos Espíritos depende de sua elevação efetiva, e que eles necessitem estar no topo de uma montanha, ou acima das nuvens, para abarcar o tempo e o espaço. Essa faculdade é inerente ao estado de espiritualização ou, se se quiser, de desmaterialização. Por outras palavras, a espiritualização produz um efeito que se pode comparar, embora muito imperfeitamente, ao da visão de conjunto do homem que está no alto da montanha. Esta comparação apenas objetivava mostrar que acontecimentos que estão no futuro para uns, estão no presente para outros e podem, assim, ser preditos, o que não implica que o efeito se produza da mesma maneira.

Para gozar dessa percepção, o Espírito não precisa, portanto, transportar-se para um ponto qualquer no espaço. Aquele que está na Terra, ao nosso lado, pode possuíla em sua plenitude, da mesma forma que a possuiria se estivesse a milhares de léguas, ao passo que nós nada vemos fora do horizonte visual. Não se produzindo a visão, nos Espíritos, da mesma maneira nem com os mesmos elementos que no homem, seu horizonte visual é muito diferente. Ora, aí está precisamente o sentido que nos falta para concebê-lo. Ao lado do encarnado, o Espírito é como um vidente ao lado de um cego.

Além disso, é necessário levar em consideração que essa percepção não se limita à extensão, mas compreende a penetração em todas as coisas. É, repetimo-lo, uma faculdade inerente e proporcional ao estado de desmaterialização. Essa faculdade é amortecida pela encarnação, mas não é completamente anulada, porque a alma não está encerrada no corpo como numa caixa. O encarnado a possui na medida do adiantamento do Espírito, posto que sempre em menor grau do que quando inteiramente desprendido. É o que dá a certos homens um poder de penetração que a outros falta completamente, uma justeza maior no golpe de vista moral, uma compreensão mais fácil das coisas imateriais. O Espírito não só percebe, mas se recorda do que viu no estado de Espírito, e essa lembrança é como um quadro que fica gravado em sua mente. Na encarnação ele vê, mas vagamente, como que através de um véu. No estado de liberdade ele vê e concebe claramente. O princípio da visão não está fora dele, mas nele. É por isso que não necessita de nossa luz exterior. Pelo desenvolvimento moral, o círculo das ideias e da concepção se alarga; pela desmaterialização gradual do perispírito, ele se purifica dos elementos grosseiros que alteravam a delicadeza das percepções, de onde é fácil compreender que a extensão de todas as faculdades decorre do progresso do Espírito.

É o grau da extensão das faculdades do Espírito que, na encarnação, o torna mais ou menos apto a conceber as coisas espirituais. Contudo, essa aptidão não é a consequência necessária do desenvolvimento intelectual, porque a Ciência vulgar não a dá. É por isso que se vêm homens de grande inteligência e grande saber, tão cegos para as coisas espirituais quanto outros o são para as coisas materiais. Eles são a elas refratários porque não as compreendem. Isto se dá porque seu progresso ainda não se realizou nesse sentido, ao passo que se veem pessoas de inteligência e instrução vulgares apreendê-las com a maior facilidade, o que prova que tinham a sua intuição prévia.

A faculdade de mudar de ponto de vista e de olhar do alto não só dá a solução do problema da presciência; é, além disso, a chave da verdadeira fé, da fé sólida. É também o mais poderoso elemento de força e de resignação, porque, então, aparecendo a vida terrena como um ponto na imensidade, compreende-se o pouco valor das coisas que vistas debaixo parecem tão importantes. Os incidentes, as misérias, as vaidades da vida se apequenam à medida que se desenrola o imenso e esplêndido horizonte do futuro. Aquele que assim vê as coisas deste mundo, pouco ou nada é atingido pelas vicissitudes e, por isto mesmo, é tão feliz quanto o pode ser aqui em baixo. É preciso, pois, lamentar os que concentram seus pensamentos na estreita esfera terrena, porque eles ressentem, em toda a sua força, o contragolpe de todas as tribulações que, como tantos aguilhões, os ferem incessantemente.

Quanto ao futuro do Espiritismo, como se sabe, os Espíritos são unânimes em afirmar o seu triunfo próximo, a despeito dos entraves que lhe opõem. Essa previsão lhes é fácil, primeiro porque sua propagação é obra pessoal deles, e eles sabem, consequentemente, o que devem fazer, e em segundo lugar, porque lhes basta abarcar um período de curta duração e porque, nesse período, veem em sua rota os poderosos auxiliares que Deus lhes suscita, e que não tardarão a manifestar-se. Sem serem Espíritos desencarnados, que os espíritas se transportem apenas trinta anos à frente, em meio à geração que surge; que daí considerem o que hoje se passa; que sigam a fieira, e verão consumir-se em vãos esforços os que se julgam chamados a destruí-lo. Eles os verão desaparecendo da cena pouco a pouco, ao lado da árvore que cresce e cujas raízes cada dia mais se estendem.

Completaremos este estudo pelas referências que existem entre a presciência e a fatalidade. Enquanto esperamos, remetemos o leitor ao que, sobre o último ponto, foi dito em o Livro dos Espíritos, nº. 851 e seguintes.


Esta obra é hoje muito conhecida para que haja necessidade de lhe fazer uma análise. Assim, limitar-nos-emos a examinar o ponto de vista em que se colocou o autor e daí deduzir algumas consequências.

A tocante dedicatória à alma de sua irmã é posta pelo Sr. Renan no topo do volume; posto que muito curta é, em nossa opinião, um trecho capital, porque é toda uma profissão de fé. Citamo-la integralmente porque dá lugar a algumas observações importantes e de interesse geral.



A ALMA PURA DE MINHA IRMÃ HENRIETTE FALECIDA EM BIBLOS, A 24 DE SETEMBRO DE 1861

“Lembras-te, do seio de Deus onde repousas, daqueles longos dias e Ghazir, onde, só contigo, eu escrevia estas páginas inspiradas pelos lugares que acabáramos de percorrer? Silenciosa ao meu lado, relias cada página e a recopiavas assim que escrita, enquanto o mar, as aldeias, as ravinas, as montanhas se desenrolavam aos nossos pés. Quando a luz extenuante tinha tomado o lugar do inumerável exército de estrelas, tuas perguntas finas e delicadas, tuas dúvidas discretas me reconduziam ao objeto sublime de nossos pensamentos comuns. Um dia me dizias que amarias este livro, primeiro porque tinha sido feito contigo, e também porque te agradava. Se às vezes temias para ele as estreitas opiniões do homem frívolo, sempre estiveste persuadida de que as almas verdadeiramente religiosas acabariam gostando dele. Em meio a essas doces meditações, a morte nos feriu a ambos com sua asa. O sono da febre nos tomou à mesma hora. Despertei só!... Agora dormes na terra de Adonis, junto da santa Biblos e das águas sagradas onde as mulheres dos mistérios antigos vinham misturar suas lágrimas. Revela-me, ó bom gênio, a mim que tu amavas, essas verdades que dominam a morte, impedem o medo e quase a fazem amar.”

A menos que se suponha que o Sr. Renan tenha representado uma comédia indigna, é impossível que tais palavras brotem da pena de um homem que crê no nada. Certamente veem-se escritores de talento flexível jogarem com as ideias e com as crenças mais contraditórias a ponto de iludirem quanto aos seus próprios sentimentos. É que, como o autor, eles possuem a arte da imitação. Para eles uma ideia não precisa ser artigo de fé. É um tema sobre o qual eles trabalham, por pouco que ela se preste à imaginação, e que eles arranjam, de uma ou de outra maneira, conforme o exijam as circunstâncias. Mas há assuntos nos quais o mais endurecido incrédulo não poderia tocar sem se sentir sacrílego. Tal é o da dedicatória do Sr. Renan. Em caso semelhante, um homem generoso se abstém em vez de falar contra a sua convicção. Estes não são daqueles assuntos que se escolhem para impressionar.

Tomando as formas dessa dedicação como expressão conscienciosa do pensamento do autor, aí se encontra mais que um vago pensamento espiritualista. Com efeito, não é a alma perdida nas profundezas do espaço, absorvida numa eterna e beata contemplação ou em dores infindas; também não é a alma do panteísta, aniquilando-se no oceano da inteligência universal. É o quadro da alma individual, com a lembrança de suas afeições e ocupações terrenas, voltando aos lugares que habitou, junto às pessoas amadas. O Sr. Renan não falaria assim a um mito, a um ser abismado no nada. Para ele, a alma de sua irmã está ao seu lado. Ela o vê, o inspira e se interessa por seus trabalhos. Há entre ela e ele uma troca de pensamentos, de comunicação espiritual. Sem disso se dar conta, ele faz, como tantos outros, uma verdadeira evocação. Que falta a essa crença para ser completamente espírita? A comunicação material. Por que, então, o Sr. Renan a arroja entre as crenças supersticiosas? Porque ele não admite nem o sobrenatural nem o maravilhoso. Mas, se ele reconhecesse o estado real da alma após a morte, bem como as propriedades de seu envoltório perispiritual, compreenderia que o fenômeno das manifestações espíritas não foge às leis naturais, e que para isto não é necessário recorrer ao maravilhoso; que se o fenômeno deve ter-se produzido em todos os tempos e em todos os povos, tem sido a fonte de uma porção de fatos seguramente qualificados por uns de sobrenaturais e por outros atribuídos à imaginação; que ninguém tem o poder de impedir tais manifestações e que, em certos casos, é possível provocá-las.

O que faz, então, o Espiritismo, senão nos revelar uma nova lei da Natureza? A respeito de uma certa ordem de fenômenos, ele faz o que para outros fez a descoberta das leis da eletricidade, da gravitação, da afinidade molecular, etc. Então, teria a Ciência a pretensão de haver dito a última palavra da Natureza? Existe alguma coisa mais surpreendente, mais maravilhosa do que corresponder-se em minutos com uma pessoa que está a quinhentas léguas? Antes do conhecimento da lei da eletricidade, semelhante fato teria passado por magia, feitiçaria, diabrura ou milagre. Sem dúvida nenhuma, um sábio a quem o houvessem contado tê-lo-ia repelido, e não lhe faltariam excelentes razões para demonstrar que era materialmente impossível. Impossível, sem dúvida, segundo as leis então conhecidas, mas perfeitamente possível segundo uma lei que não era conhecida. Por que, então, seria mais fácil comunicar-se instantaneamente com um ser vivo, cujo corpo está a quinhentas léguas, do que com a alma desse mesmo ser que está ao nosso lado? Dizem que é porque ele não tem mais corpo. E quem vos diz que ele não tem? É precisamente o contrário que o Espiritismo vem provar, demonstrando que se sua alma não tem mais o envoltório material, compacto, ponderável, ela tem um fluídico, imponderável, mas que não deixa de ser uma espécie de matéria; que esse envoltório, invisível no estado normal, pode, em dadas circunstâncias e por uma espécie de modificação molecular, tornar-se visível, como o vapor pela condensação. Como se vê, há aí apenas um fenômeno muito natural, cuja chave o Espiritismo dá, pela lei que rege as relações entre o mundo visível e o invisível.

O Sr. Renan, persuadido de que a alma de sua irmã, ou o seu Espírito, o que dá na mesma, estava junto de si, a via e escutava, devia crer que essa alma era alguma coisa. Se alguém tivesse vindo dizer-lhe: Essa alma, cuja presença o vosso pensamento adivinha, não é um ser vago e indefinido; é um ser limitado, circunscrito por um corpo fluídico, invisível como a maioria dos fluidos; para ela a morte não foi senão a destruição de seu envoltório corporal, mas ela conservou seu envoltório etéreo e indestrutível, de sorte que tendes ao vosso lado a vossa irmã tal qual era em vida, menos o corpo que deixou na Terra, como a borboleta deixa a sua crisálida; morrendo, ela apenas despojou-se da vestimenta grosseira, que não mais lhe pode servir, que a retinha na superfície do solo, mas conservou a roupagem leve, que lhe permite transportar-se para onde queira e transpor o espaço com a rapidez do raio; do ponto de vista moral, é a mesma pessoa, com os mesmos pensamentos, as mesmas afeições, a mesma inteligência, mas com percepções novas, mais amplas, mais sutis, pois suas faculdades não mais são comprimidas pela matéria pesada e compacta, através da qual elas deviam transmitir-se. Dizei se este quadro tem algo de irracional! O Espiritismo, provando que ele é real, é tão ridículo quanto alguns o pretendem? O que faz ele, afinal de contas? Ele demonstra, de maneira patente, a existência da alma. Provando que ela é um ser definido, ele dá um objetivo real às nossas lembranças e afeições. Se o pensamento do Sr. Renan não passava de um sonho, de uma ficção poética, o Espiritismo vem transformar essa ficção em realidade.

A Filosofia, em todas as épocas, empenhou-se na busca da alma, de sua natureza, de suas faculdades, de sua origem e de seu destino. Inúmeras teorias foram erigidas a respeito, e a questão sempre ficou indefinida. Por quê? Aparentemente porque nenhuma encontrou o nó do problema, e não o resolveu de maneira satisfatória para convencer a todos.

O Espiritismo, a seu turno, vem dar a sua teoria. Ele se apoia na psicologia experimental; ele estuda a alma, não só durante a vida, mas após a morte; ele a observa em estado de isolamento; ele a vê agir em liberdade, ao passo que a filosofia ordinária só a vê em união com o corpo, submetida aos entraves da matéria, razão pela qual muitas vezes confunde causa e efeito. Ela se esforça por demonstrar a existência e os atributos da alma por fórmulas abstratas, ininteligíveis para as massas, ao passo que o Espiritismo oferece provas palpáveis de sua existência, e permite que ela seja, por assim dizer, tangível pelos dedos e pelos olhos. Ele se exprime em termos claros, ao alcance de todos. A simplicidade da linguagem lhe tiraria o caráter filosófico, como o pretendem certos sábios?

Contudo, aos olhos de muita gente a filosofia espírita contém um erro grave, e esse erro se exprime numa só palavra. Esta palavra alma, mesmo para os incrédulos, tem algo de respeitável e imponente. Ao contrário, o vocábulo Espírito neles desperta as ideias fantásticas das lendas, dos contos de fadas, dos fogos-fátuos, de lobisomens, etc. Eles admitem de boa mente que se possa crer na alma, posto eles mesmos não creiam, mas não podem compreender que, com bom-senso, se possa crer nos Espíritos. Daí uma prevenção que os faz olhar esta ciência como pueril e indigna de sua atenção. Julgando-a pela etiqueta, creem-na inseparável da magia e da feitiçaria.

Se o Espiritismo se tivesse abstido de pronunciar a palavra Espírito e se, em todas as circunstâncias a tivesse substituído pela palavra alma, a impressão para eles teria sido absolutamente outra. A rigor, esses profundos filósofos, esses livrespensadores admitirão, sem problemas, que a alma de um ser que nos foi caro ouça os nossos lamentos e nos venha inspirar, mas não admitirão que isto aconteça com seu Espírito. O Sr. Renan pôde colocar no topo de sua dedicatória: “À alma pura de minha irmã Henriette. Ele não poderia ter colocado: Ao Espírito puro...?

Então, por que o Espiritismo se serviu do vocábulo Espírito? É um erro? Não, ao contrário.

Em primeiro lugar, desde as primeiras manifestações, antes mesmo da criação da filosofia espírita, esse vocábulo já era usado. Como se tratava de deduzir as consequências morais dessas manifestações, era útil conservar uma denominação usual, a fim de mostrar a conexão dessas duas partes da ciência. Além disso, era evidente que a prevenção ligada a esse vocábulo, circunscrita a uma categoria especial de pessoas, deveria apagar-se com o tempo. O inconveniente era apenas momentâneo.

Em segundo lugar, se o vocábulo Espírito era repulsivo para algumas pessoas, para as massas ele era um atrativo, e deveria contribuir mais que outro para popularizar a doutrina. Assim, pois, era preciso preferir o maior número ao menor.

Um terceiro motivo é mais sério que os dois outros. Os termos alma e Espírito, posto que sinônimos e empregados indiferentemente, não exprimem exatamente a mesma ideia. A alma é, a bem dizer, o princípio inteligente, princípio imperceptível e indefinido como o pensamento. No estado dos nossos conhecimentos, não podemos conceber o Espírito isolado da matéria de maneira absoluta. O perispírito, posto formado de matéria sutil, dele faz um ser limitado, definido e circunscrito a sua individualidade espiritual, de onde se pode formular esta proposição: A união da alma, do perispírito e do corpo material constitui o HOMEM; a alma e o perispírito separados do corpo constituem o ser chamado ESPÍRITO. Nas manifestações, não é, pois, a alma que se apresenta sozinha. Ela está sempre revestida de seu envoltório fluídico, e esse envoltório é o intermediário necessário, através do qual ela age sobre a matéria compacta. Nas aparições não é a alma que se vê, mas o perispírito, do mesmo modo que quando se vê um homem vê-se o seu corpo, mas não se vê o pensamento, a força, o princípio que o faz agir.

Em resumo, a alma é o ser simples, primitivo; o Espírito é o ser duplo; o homem é o ser triplo. Se adicionarmos ao homem as roupas, teremos um ser quádruplo. Na circunstância de que se trata, o vocábulo Espírito é o que melhor corresponde à coisa expressa. Pelo pensamento concebe-se um Espírito, mas não se concebe uma alma.

Convencido de que a alma de sua irmã o via e o entendia, o Sr. Renan não podia supor que ela estivesse sozinha no espaço. Uma simples reflexão deveria dizer-lhe que deve acontecer o mesmo com todas aquelas que deixam a Terra. As almas ou Espíritos assim espalhados na imensidade constituem o mundo invisível que nos cerca e em cujo meio vivemos, de modo que esse mundo não é composto de seres fantásticos, de gnomos, de duendes, de demônios chifrudos com pés bifurcados, mas dos mesmos seres que formaram a Humanidade terrena. Que há nisso de absurdo? O mundo visível e o invisível assim se acham em contato perpétuo, daí resultando uma incessante reação de um sobre o outro. Daí decorre uma porção de fenômenos que entram na ordem dos fatos naturais. O Espiritismo moderno não os descobriu nem os inventou. Ele os estudou melhor e melhor os observou. Ele procurou as suas leis e, por isso mesmo, as subtraiu da ordem dos fatos maravilhosos.

Os fatos que se ligam ao mundo invisível e às suas relações com o mundo visível, mais ou menos observados em todas as épocas, se ligam à história de quase todos os povos, e sobretudo à história religiosa. Eis por que a eles se referem muitas passagens de escritores sacros e profanos. É por falta de conhecimento dessas relações que tantas passagens ficaram ininteligíveis e foram interpretadas tão diversamente e tão falsamente.

É pela mesma razão que o Sr. Renan enganou-se tão estranhamente quanto à natureza dos fatos relatados no Evangelho e quanto ao sentido das palavras do Cristo, seu papel e seu verdadeiro caráter, como o demonstraremos em próximo artigo. Estas reflexões, às quais nos conduziu o seu preâmbulo, eram necessárias para apreciar as consequências por ele tiradas do ponto de vista em que se colocou.

Senhores e caros colegas,

A Sociedade inicia seu sétimo ano, e essa duração não deixa de ter significação, quando se trata de uma ciência nova. Um fato que não é de menor importância é que ela seguiu constantemente uma marcha ascendente. Contudo, senhores, sabeis que é menos no sentido material que no sentido moral que se realizou o seu progresso. Não somente ela não abriu suas portas ao primeiro que apareceu, nem solicitou que dela fizesse parte quem quer que fosse, porém, mais visou circunscrever-se do que expandir-se indefinidamente.

O número dos membros ativos é, com efeito, uma questão secundária para toda sociedade que, como esta, não visa entesourar. Não são mantenedores que ela busca, por isso não se prende à quantidade. Assim o quer a natureza de seus trabalhos, exclusivamente científicos, para os quais são necessários a calma e o recolhimento, e não o movimento da multidão.

O sinal de prosperidade da Sociedade não está, pois, na cifra de seu pessoal, nem no seu encaixe. Está inteiramente na progressão de seus estudos, na consideração que conquistou, no ascendente moral que exerce lá fora, enfim, no número de adeptos que se ligam aos princípios que ela professa, mesmo sem dela fazerem parte.

A esse respeito, senhores, sabeis que o resultado ultrapassou todas as previsões. E, coisa notável, não é somente na França que ela exerce tal ascendente, mas no estrangeiro, porque, para os verdadeiros espíritas, todos os homens são irmãos, seja qual for a nação a que pertençam. A prova material disto tendes no número de sociedades e grupos que, de diversos países, vêm colocar-se sob o seu patrocínio e lhe pedir conselhos. Isto é um fato notório e tanto mais característico quanto essa convergência para ela se faz espontaneamente, porque não é menos notório que ela não o provocou nem o solicitou. É, pois, voluntariamente que se vêm colocar sob a bandeira que ela hasteou. A que se deve tudo isto? As causas são múltiplas. Não é inútil examiná-las, porque isto entra na história do Espiritismo.

Uma dessas causas vem naturalmente do fato de que, sendo a primeira regularmente constituída, ela também foi a primeira a alargar o círculo de seus estudos e abraçou todas as partes da ciência espírita. Quando o Espiritismo mal saía do período da curiosidade e das mesas girantes, ela entrou resolutamente no período filosófico, que, de certo modo, inaugurou. Por isso mesmo, logo de princípio, atraiu a atenção de pessoas sérias.

Mas isto para nada teria servido, se ela tivesse ficado alheia aos princípios ensinados pela generalidade dos Espíritos. Se ela tivesse professado apenas suas próprias ideias, jamais teria imposto essas ideias à imensa maioria dos adeptos de todos os países. A Sociedade representa os princípios formulados no Livro dos Espíritos, e sendo esses princípios ensinados por toda parte, muito naturalmente todos se ligaram ao centro de onde aqueles partiam, ao passo que aqueles que se colocaram fora desse centro ficaram isolados, por não encontrarem eco entre os Espíritos.

Repetirei aqui o que disse alhures, porque nunca seria demasiado repetir:

A força do Espiritismo não reside na opinião de um homem ou de um Espírito. Ela está na universalidade do ensino dado por estes últimos. O controle universal, como o sufrágio universal, resolverá no futuro todas as questões litigiosas. Ele estabelecerá a unidade da doutrina muito melhor que um concílio de homens. Ficai certos, senhores, que esse princípio abrirá seu caminho, como o Fora da caridade não há salvação, porque ele está embasado na mais rigorosa lógica e na abdicação da personalidade. Ele não poderá contrariar senão os adversários do Espiritismo, bem como aqueles que só têm fé em suas luzes pessoais.

A Sociedade de Paris conquistou a posição que ocupa porque jamais se afastou dessa via traçada pela razão sadia. As pessoas nela confiam porque sabem que ela não avança levianamente; que ela não impõe suas próprias ideias e que, por sua posição, mais do que ninguém, ela pode constatar o sentido em que se pronuncia aquilo que se pode justamente chamar o sufrágio universal dos Espíritos. Se algum dia ela se colocasse à margem da maioria, forçosamente deixaria de ser o ponto de ligação. O Espiritismo não cairia, porque ele tem seu ponto de apoio em toda parte, mas, não mais tendo o seu por toda a parte, a Sociedade cairia.

Com efeito, por sua natureza totalmente excepcional, o Espiritismo não repousa mais numa sociedade do que num indivíduo. A de Paris jamais disse: Fora de mim não há Espiritismo, pois assim ela deixaria de existir, ao passo que o Espiritismo não deixaria de seguir o seu curso, porque ele tem as suas raízes na inumerável multidão de intérpretes dos Espíritos no mundo inteiro, e não numa reunião qualquer, cuja existência é sempre eventual.

Os testemunhos que a Sociedade recebe provam que ela é estimada e considerada, e certamente é o de que mais se felicita. Se a primeira causa disso está na natureza de seus trabalhos, é justo acrescentar que ela o deve também ao bom conceito que levaram de suas sessões os numerosos estrangeiros que vieram visitála. A ordem, a dignidade, a seriedade, os sentimentos de fraternidade que eles viram aí reinar, melhor do que todas as palavras convenceram-nos de seu caráter eminentemente sério.

É essa, senhores, a posição que, como fundador da Sociedade, eu tratei de lhe assegurar. É também essa a razão pela qual jamais cedi a qualquer incitamento que tendesse a desviá-la do caminho da prudência. Deixei que falassem e agissem os impacientes de boa ou de má-fé. Sabeis o que eles se tornaram, ao passo que a Sociedade ainda está de pé.

A missão da Sociedade não é fazer adeptos por si mesma, por isso jamais convoca o público. O objetivo de seus trabalhos, como indica o seu nome, é o progresso da ciência espírita. Para isto ela aproveita não só as suas observações, mas também as que são feitas alhures. Ela recolhe documentos que lhe chegam de todos os lados, estuda-os, investiga-os, compara-os para lhes deduzir os princípios e tirar os ensinamentos que ela difunde, mas que não o faz levianamente. É assim que os seus trabalhos a todos beneficiam, e se eles adquiriram uma certa autoridade, é porque todos sabem que eles são feitos conscientemente, sem prevenção sistemática contra as pessoas ou as coisas.

Compreende-se, pois, que, para atingir tal objetivo, um número de membros mais ou menos considerável é indiferente. O resultado seria alcançado com uma dúzia de pessoas, tão bem ou ainda melhor do que com algumas centenas. Não tendo em vista nenhum interesse material, eis a razão pela qual ela não visa o número. Sendo o seu objetivo grave e sério, nada faz visando a curiosidade. Enfim, como os elementos da ciência nada lhe ensinariam de novo, ela não perde tempo repetindo o que já sabe. Como dissemos, seu papel é trabalhar pelo progresso da ciência, pelo estudo. Não é junto dela que aqueles que nada sabem vêm convencer-se, mas que os adeptos já iniciados vêm colher novas instruções. É este o seu verdadeiro caráter. O que lhe é preciso, o que lhe é indispensável, são relações amplas que lhe permitam ver do alto o movimento geral, para julgar o conjunto, a ele conformar-se e o dar a conhecer. Ora, ela possui tais relações, que vieram por si mesmas e que aumentam diariamente, como tendes provas pela correspondência.

O número de grupos que se formam sob os seus auspícios e solicitam o seu patrocínio pelos motivos dados acima, é o fato mais característico do ano social que acaba de passar. Este fato não só é muito honroso para a Sociedade, é, além disso, de uma importância capital, pois testemunha, ao mesmo tempo, a extensão da doutrina e o sentido no qual tende a estabelecer-se a unidade.

Os que nos conhecem sabem a natureza das relações existentes entre a Sociedade de Paris e as demais sociedades, mas é essencial que todo mundo o saiba, para evitar os equívocos a que as alegações da malevolência poderiam dar lugar. Portanto, não é supérfluo repetir que os espíritas não formam entre si nem uma congregação, nem uma associação; que entre as diversas sociedades não há nem solidariedade material nem filiação oculta ou ostensiva; que elas não obedecem a nenhuma palavra de ordem secreta; que aqueles que delas fazem parte são sempre livres para deixá-las, se isso lhes convém; que se elas não abrem as portas ao público, não é porque aí se passe nada de misterioso ou de oculto, mas porque elas não querem ser perturbadas pelos curiosos e importunos. Longe de agir na sombra, elas estão, ao contrário, sempre prontas a submeter-se às investigações da autoridade legal e às prescrições que lhes forem impostas. A de Paris tem sobre as outras apenas autoridade moral, devida à sua posição e aos seus estudos, e porque lha conferem. Ela dá os conselhos que reivindicam de sua experiência, mas não se impõe a nenhuma. A única palavra de ordem que ela dá, como senha entre os verdadeiros espíritas, e esta: Caridade para com todos, mesmo para com os inimigos. Assim, ela declinaria de toda solidariedade moral com aquelas que se afastassem desse princípio; que tivessem por móvel o interesse material; que em vez de manter a união e a boa harmonia, tendessem a semear a divisão entre os adeptos, porque, por isso mesmo, colocar-se-iam fora da doutrina.

A Sociedade de Paris não pode assumir a responsabilidade pelos abusos que, por ignorância ou por outras causas, possam fazer do Espiritismo. Ela não pretende, de forma alguma, cobrir com o seu manto aqueles que os cometem, nem pode nem deve tomar-lhes a defesa perante a autoridade, em caso de perseguição, porque isto seria aprovar o que a doutrina desaprova. Quando a crítica se dirige a tais abusos, não temos que refutá-la, mas apenas responder: Se vos désseis ao trabalho de estudar o Espiritismo, veríeis o que ele diz e não o acusaríeis daquilo que ele condena. Assim, cabe aos espíritas sinceros evitar cuidadosamente tudo quanto pudesse dar lugar a uma crítica fundada. Eles seguramente conseguirão isto mantendo-se nos preceitos da doutrina.

Não é por que uma reunião se intitula grupo, círculo ou sociedade espírita que necessariamente deve ter as nossas simpatias. A etiqueta jamais foi garantia absoluta da qualidade da mercadoria, mas, segundo a máxima “Conhece-se a árvore pelo seu fruto” nós a apreciamos em razão dos sentimentos que a animam, do móvel que a dirige e a julgamos por suas obras. A Sociedade de Paris se felicita quando pode inscrever na lista de seus aderentes, reuniões que oferecem todas as garantias desejáveis de ordem, de boas atitudes, de sinceridade, de devotamento e de abnegação pessoal, e que pode oferecê-las como modelos aos seus irmãos em crença.

A posição da Sociedade de Paris é, pois, exclusivamente moral, e ela jamais ambicionou outra. Aqueles dentre nossos antagonistas que pretendem que todos os espíritas são seus tributários; que ela enriquece às suas custas, arrancando-lhes dinheiro em seu proveito; que avaliam o seu lucro pelo número de adeptos, dão provas de notável má-fé ou da mais absoluta ignorância daquilo de que falam. Sem dúvida ela tem por si a sua consciência, mas têm, a mais, para confundir a impostura, os seus arquivos, que testemunharão sempre a verdade, no presente como no futuro.

Sem desígnio premeditado, e pela força das coisas, a Sociedade tornou-se um centro para onde convergem os ensinamentos de toda sorte concernentes ao Espiritismo. Ela se encontra, neste aspecto, numa situação que se pode dizer excepcional, pelos elementos que possui para assentar a sua opinião. Melhor do que ninguém, ela pode, pois, conhecer o estado real do progresso da doutrina em cada país, e apreciar as causas locais que podem favorecê-lo ou retardar-lhe o desenvolvimento. Essa estatística não será um dos elementos menos preciosos para a história do Espiritismo, ao mesmo tempo que permite estudar as manobras dos adversários e calcular a extensão dos golpes que vibram para derrubá-lo. Bastaria essa observação para permitir prever o resultado definitivo e inevitável da luta, como se julga o desfecho de uma batalha pelo movimento dos dois exércitos.

Pode-se dizer com inteira verdade que nesse particular estamos na primeira linha para observar, não só a tática dos homens, mas também a dos Espíritos. Vemos, com efeito, da parte destes, uma unidade de vistas e de plano sábia e providencialmente combinada, ante a qual forçosamente devem quebrar-se todos os esforços humanos, porque os Espíritos podem atingir os homens e feri-los, ao passo que escapam destes últimos. Como se vê, a partida é desigual.

A história do Espiritismo moderno será uma coisa realmente curiosa, porque será a da luta entre o mundo visível e o invisível. Os Antigos teriam dito: A guerra dos homens contra os deuses. Será também a dos fatos, mas, sobretudo e forçosamente, a dos homens que neles tiverem representado um papel ativo, num como noutro sentido, isto é, como verdadeiros sustentáculos ou como adversários da causa. É preciso que as gerações futuras saibam a quem deverão um justo tributo de reconhecimento. É preciso que consagrem a memória dos verdadeiros pioneiros da obra regeneradora, e que não haja glórias usurpadas.

O que dará a essa história um caráter particular é que, em vez de ser feita, como muitas outras, muitos anos ou séculos depois dos acontecimentos, com base nas tradições e nas lendas, ela se faz enquanto os fatos acontecem, e baseada em dados autênticos, dos quais nós possuímos, por uma correspondência incessante, vinda de todos os países onde se implanta a doutrina, o mais vasto e mais completo arquivo existente no mundo.

Sem dúvida o Espiritismo, em si mesmo, não pode ser atingido pelas mentirosas alegações de seus adversários, com cujo auxílio procuram fantasiá-lo. Elas poderiam, entretanto, dar uma falsa ideia de seus primórdios e de seus meios de ação, desnaturando os atos e o caráter dos homens que nele tiverem cooperado, se não se lhes desse a contrapartida oficial. Esses arquivos serão, para o futuro, a luz que espancará todas as dúvidas, uma mina onde os comentadores futuros poderão colher com certeza. Vedes, senhores, de que importância se reveste este trabalho, no interesse da verdade histórica. A nossa própria Sociedade nele está interessada, em razão da parte que toma no movimento.

Diz um provérbio: “Nobreza obriga.” A posição da Sociedade lhe impõe também as obrigações de conservar seu crédito e seu ascendente moral. A primeira é a de não se afastar, quanto à teoria, da linha seguida até hoje, pois que recolhe os seus frutos; a segunda está no bom exemplo que deve dar, justificando, pela prática, a excelência da doutrina que professa. Sabe-se que esse exemplo, provando a influência moralizadora do Espiritismo, é um poderoso elemento de propaganda, e, ao mesmo tempo, o melhor meio de fechar a boca dos detratores. Um incrédulo, que não conhecia senão a filosofia da doutrina, dizia que com tais princípios o espírita necessariamente deveria ser um homem de bem. Estas palavras são profundamente verdadeiras, mas, para serem completas, é preciso acrescentar que um verdadeiro espírita deve ser, necessariamente, bom e benevolente para com os seus semelhantes, isto é, praticar a caridade evangélica na sua mais larga acepção.

É a graça que todos devemos pedir que Deus nos conceda, tornando-nos dóceis aos conselhos dos bons Espíritos que nos assistem. Peçamos igualmente a eles que continuem nos protegendo durante o ano que se inicia, e que nos deem a força de nos tornarmos dignos deles. É o mais seguro meio de justificar e conservar a posição que a Sociedade conquistou.

A. K.


Algumas pessoas perguntam por que a Doutrina Espírita não é a mesma no antigo e no novo continente, e em que consiste a diferença. É o que vamos tentar explicar.

Como se sabe, as manifestações ocorreram em todos os tempos, tanto na Europa como na América, e hoje, que as pessoas se dão conta da coisa, recordam-se de uma porção de fatos que tinham passado despercebidos, e que se encontram em abundância consignados em escritos autênticos. Entretanto, esses fatos eram isolados. Nestes últimos tempos eles se produziram nos Estados Unidos em escala bastante ampla para despertar a atenção geral dos dois lados do Atlântico. A extrema liberdade que existe nesse país favoreceu a eclosão das ideias novas, e é por isto que os Espíritos o escolheram para o primeiro teatro de seus ensinamentos.

Ora, acontece muitas vezes que uma ideia surge num país e se desenvolve em outro, como se vê nas ciências e na indústria. A esse respeito, o gênio americano deu suas provas, e nenhum motivo tem para invejar a Europa. Contudo, se ele se destaca em tudo o que diz respeito ao comércio e às artes mecânicas, não se pode recusar à Europa o destaque nas ciências morais e filosóficas. Devido a essa diferença no caráter normal dos povos, o Espiritismo experimental estava em seu hábitat na América, ao passo que a parte teórica e filosófica encontrava na Europa elementos mais propícios ao seu desenvolvimento. Assim, foi lá que ela nasceu e em poucos anos ali conquistou o primeiro lugar. Ali, os fatos inicialmente despertaram a curiosidade, mas, constatados os fatos e satisfeita a curiosidade, as pessoas logo se cansaram das experiências materiais sem resultados positivos. Já o mesmo não se deu a partir do momento em que se desdobraram as consequências morais desses mesmos fatos para o futuro da Humanidade. Foi então que o Espiritismo tomou posição entre as ciências filosóficas. Ele avançou a passos de gigante, malgrado os obstáculos que lhe foram suscitados, porque ele satisfazia às aspirações das massas, e porque prontamente compreenderam que ele vinha encher o vazio imenso nas crenças e resolver o que até então parecia insolúvel.

Assim, a América foi o berço do Espiritismo, mas foi na Europa que ele cresceu e fez suas humanidades. Deve a América ficar por isso enciumada? Não, porque noutros pontos ela levou vantagem. Não foi na Europa que as máquinas a vapor nasceram, e não foi na América que encontraram condições vantajosas? A cada um o seu papel, conforme suas aptidões, e a cada povo o seu, segundo seu gênio particular.

O que particularmente distingue a escola espírita dita americana da escola europeia é a predominância, na primeira, da parte fenomênica, à qual se ligam mais especialmente e, na segunda, a parte filosófica. A filosofia espírita da Europa espalhou-se prontamente porque ela ofereceu, desde o começo, um conjunto completo; porque ela mostrou o objetivo e alargou o horizonte das ideias. Incontestavelmente, é ela que hoje prevalece no mundo inteiro.

Até hoje os Estados Unidos pouco se afastaram de suas ideias primitivas. Isto significa que eles ficarão sozinhos na retaguarda do movimento geral? Seria cometer uma injúria à inteligência desse povo. Aliás, os Espíritos lá estão para impulsioná-lo na via comum, dando-lhe o ensino que dão alhures. Eles superarão pouco a pouco as resistências que poderiam nascer do amor-próprio nacional.

Se os americanos repelirem a teoria europeia, porque vem da Europa, aceitá-laão quando ela surgir em seu meio, pela voz dos próprios Espíritos. Eles cederão ao ascendente, não da opinião de alguns homens, mas do controle universal do ensino dos Espíritos, esse poderoso critério, como o demonstramos em nosso artigo sobre a autoridade da Doutrina Espírita. É apenas uma questão de tempo, sobretudo quando houverem desaparecido as questões pessoais.

De todos os princípios da doutrina, o que encontrou mais oposição na América, e por América devemos entender apenas os Estados Unidos, é o da reencarnação. Pode mesmo dizer-se que é a única divergência capital, pois as outras dizem respeito mais à forma do que ao fundo, e isto porque lá os Espíritos ainda não a ensinaram, e já explicamos as razões disto.

Os Espíritos procedem em toda parte com sabedoria e prudência. Para se fazerem aceitar, evitam chocar muito bruscamente as ideias estabelecidas. Eles não irão dizer inconsideradamente a um muçulmano que Maomé é um impostor. Nos Estados Unidos, o dogma da reencarnação teria vindo chocar-se contra os preconceitos de cor, tão profundamente arraigados no país. O essencial era fazer aceitar o princípio fundamental da comunicação do mundo visível com o invisível. As questões de detalhe viriam a seu tempo. Ora, não há dúvida que esse obstáculo acabe por desaparecer, e que um dos resultados da guerra civil atual seja o gradativo enfraquecimento dos preconceitos, que são uma anomalia numa nação tão liberal.

Se a ideia da reencarnação ainda não é aceita nos Estados Unidos de maneira mais geral, ela o é individualmente por alguns, se não como um princípio absoluto, ao menos com certas restrições, o que já é alguma coisa. Quanto aos Espíritos, sem dúvida julgando que o momento é propício, começam a ensinar com prudência em certos lugares e abertamente em outros. Uma vez levantada, a questão seguirá o seu caminho. Aliás, temos sob nossas vistas comunicações já antigas recebidas naquele país, nas quais, sem estar formalmente expressa, a pluralidade das existências é a consequência óbvia dos princípios emitidos. Aí se vê despontar a ideia. Portanto, não há dúvida que em pouco tempo o que hoje ainda se chama escola americana fundir-se-á na grande unidade que se estabelece por toda parte.

Como prova do que asseveramos, citaremos o artigo seguinte, publicado no Union, jornal de São Francisco, e um resumo da carta que o acompanhou.

“Senhor Allan Kardec,

“Posto não tenha a honra de ser vossa conhecida, tomo, como médium, a liberdade de vos enviar a notícia anexa, que esses senhores do jornal resumiram um pouco. Contudo, apesar disso, muita gente parece desejar mais. Assim, todos os vossos livros se espalham, e em breve nossas livrarias terão que fazer novos pedidos...

“Recebei, etc.

PAULINE BOULAY”


“Basta exprimir em voz alta ideias que nem todos compreendem para se ser tratado de exaltado, extravagante e louco. Não é preciso ser um sabichão para escrever o que nos ditam alma e coração.

“Um espírito forte dizia a uma senhora médium:

“─ Como vós, que sois inteligente, podeis acreditar em Espíritos invisíveis e na pluralidade das existências? “A senhora respondeu:

“─ Talvez porque eu seja inteligente é que creio nisto; o que sinto me inspira mais confiança do que o que vejo, pois o que vemos nos engana algumas vezes, mas o que sentimos jamais nos engana. O senhor tem liberdade de não acreditar. Os que creem na pluralidade das existências não são maus, e são mais desinteressados que os que não creem. Os incrédulos os tratam de loucos, mas isto não prova que digam a verdade, ao contrário, duvidar do poder de Deus é ofendê-lo, e negar o que existe além do que podemos apalpar é um ultraje dirigido ao Criador.

“Quando nos acontece algo de extraordinário, de hábito atribuímos ao acaso. Eu pergunto: O que é o acaso? O nada, responde a voz da verdade. Ora, assim, não podendo o nada produzir algo, o que existe nos vem de uma fonte produtiva. Seria muito justo pensar que o que acontece independentemente de nossa vontade é obra da Providência, dirigida pelo Senhor de nossos destinos.

“Independentemente do que disserdes; independentemente do que fizerdes, espíritos fortes, jamais destruireis esta doutrina, que sempre existiu. A ignorância das almas primitivas, não lhes permitindo compreendê-la em toda a sua extensão, imaginam que após esta vida tudo estará acabado. É um erro! Nós médiuns, mais ou menos adiantados, acabaremos vos convencendo.

“O Espiritismo não é apenas uma consolação, mas também desenvolve a inteligência; destrói todo pensamento de egoísmo, de orgulho e de avareza; põe-nos em comunicação com os que nos são caros e prepara o progresso, progresso imenso que paulatinamente destruirá todos os abusos, as revoluções e as guerras.

“A alma necessita reencarnar-se para se aperfeiçoar. Ela não pode numa única vida material aprender tudo quanto deve saber para compreender a obra do TodoPoderoso.

“O corpo é apenas um envoltório passageiro, no qual Deus envia uma alma para se aperfeiçoar e sofrer as provas necessárias ao seu adiantamento e à realização da grande obra do Criador, que somos todos chamados a servir, quando tivermos feito nossas provas e adquirido todas as perfeições.

“Todas as nossas celebridades contemporâneas são outras tantas almas que progrediram pela renovação das encarnações. Muitas dentre elas são médiuns escreventes, gênios que trazem em cada existência nova os progressos da Ciência e das artes.

“A lista dos homens de gênio aumenta de ano para ano. São outros tantos guias que Deus coloca em nosso meio para esclarecer-nos, instruir-nos, numa palavra, ensinar-nos o que ignoramos e que é absolutamente necessário que saibamos. Eles nos mostram a chaga social; procuram destruir nossos preconceitos; põem à luz e aos nossos olhos todo o mal produzido pelo egoísmo e pela ignorância. Esses gênios são animados por Espíritos superiores. Eles têm feito mais pelo progresso e pela civilização do que todos vossos fuzis e canhões, e fazem derramar mais lágrimas de ternura e de reconhecimento do que todos os vossos feitos de armas.

“Refleti seriamente no Espiritismo, homens inteligentes, e aí encontrareis grandes ensinamentos. Não há charlatanismo nessa lei divina. Tudo ali é belo, grande, sublime. Ela apenas tende a conduzir-nos à perfeição e à verdadeira felicidade moral.

“O livro escrito pelos médiuns, ditado por Espíritos superiores e errantes, é um livro de alta filosofia e de uma instrução tão profunda quanto etérea. Ele trata de tudo. É verdade que nem todos estão ainda preparados para esta crença, e para compreendê-la é necessário que a alma já se tenha reencarnado várias vezes.

“Quando todo mundo compreender o Espiritismo, nossos grandes poetas serão melhor apreciados e lidos com mais atenção e respeito. Todos os nossos literatos serão compreendidos por todos os povos e serão admirados sem inveja, porque serão conhecidas as causas e os efeitos.

“O estudo da Ciência é a mais nobre das ocupações, e o Espiritismo é a sua divindade. Por ele associamo-nos ao gênio e, como disse um dos nossos cientistas, depois do homem de gênio vem o que sabe compreendê-lo.

“A instrução faz do Espírito o que um hábil joalheiro faz do diamante. Ela lhe dá o polimento, o brilho que encanta e seduz, realçando-lhe o valor.

“A alma não tem forma propriamente dita. É uma espécie de luz, que difere por sua intensidade, conforme o grau de perfeição adquirida. Quanto mais a alma progrediu, tanto mais luminosa a sua cor.

“Quando todos fordes médiuns, podereis entreter-vos com os Espíritos, como já o fazemos, e eles vos dirão que são mais felizes que nós. Eles nos veem, nos escutam, assistem às nossas reuniões, conversam com nossa alma durante o sono, transportam-se e penetram por toda parte onde Deus os envia.

“PAULINE BOULAY”


NOTA: O princípio da reencarnação acha-se igualmente num manuscrito que nos foi enviado de Montreal, Canadá, do qual falaremos proximamente.


Aqui não se trata, como poderiam supor, de uma demonstração aprobativa da doutrina, mas, ao contrário, de nova forma de ataque, sob um título atraente e um pouco enganador, porque aquele que, acreditando no teor da propaganda, lá for pensando assistir a lições de Espiritismo, ficará muito desapontado.

Os sermões estão longe de ter tido o resultado esperado. Aliás, eles são direcionados exclusivamente aos fiéis. Além disto, exigem uma forma muito solene, muito exclusivamente religiosa, ao passo que a tribuna de ensino permite atitudes mais livres, mais familiares. O orador eclesiástico faz abstração de sua qualidade de sacerdote e torna-se professor. O sistema dará resultado? O futuro dirá.

O Padre Barricand, professor na Faculdade de Teologia de Lyon, começou no Petit-Collège uma série de lições públicas sobre, ou melhor, contra o magnetismo e o Espiritismo. O jornal la Vérité, em seu número de 10 de abril de 1864, analisa uma sessão consagrada ao Espiritismo e levanta várias asserções do orador. Promete manter os leitores ao corrente da continuação, ao mesmo tempo em que se encarrega de refutá-las, o que, não temos dúvida, fará maravilhosamente, a julgar por seu começo. O decoro e a moderação de que deu provas até hoje em sua polêmica nos dão a certeza de que não mudará nesta circunstância, mesmo que o seu contraditor mude.

Enquanto o Padre Barricand ficar no terreno da discussão dos princípios da doutrina, estará no seu direito. Não podemos censurá-lo por não compartilhar nossa opinião, por dizê-lo e por tentar provar que está com a razão. Gostaríamos que em geral o clero fosse tão partidário do livre exame quanto nós próprio. O que está fora do direito de discussão são os ataques pessoais, e sobretudo os personalismos malévolos, quando, pelas necessidades de sua causa, um adversário desnatura os fatos e os princípios que quer combater, bem como as palavras e os atos dos que os defendem. Semelhantes meios são uma prova de fraqueza e testemunham a pouca confiança que se tem nos argumentos tirados da própria coisa. São esses desvios da verdade que é necessário levantar na ocasião, mas ficando tudo nos limites do decoro e da urbanidade.

O Vérité assim resume uma parte da argumentação do Padre Barricand:

“Quanto aos espíritas, que são muito mais numerosos, igualmente me esforço por provar que hoje eles descem do pedestal pretensioso sobre o qual o Sr. Allan Kardec os entronizava em 1862. Com efeito, em 1861 o Sr. Kardec fez uma viagem por toda a França, viagem da qual complacentemente dava conhecimento ao público. Oh! Então, senhores, tudo corria às mil maravilhas, porquanto os adeptos dessa escola eram trinta mil em Lyon, dois ou três mil em Bordeaux, etc., etc. O Espiritismo parecia ter invadido toda a Europa! Ora, que se passa em 1863? O Sr. Allan Kardec não faz mais viagens... nem relatórios enfáticos! É que provavelmente ele constatou bom número de deserções, e para não desencorajar o que ainda pode restar de espíritas por uma situação pouco favorável, julgou prudente e correto abster-se.

Perdão, senhores, eu me engano. O Sr. A. Kardec consagra algumas páginas de sua Revista Espírita (janeiro de 1864), para dar-nos algumas informações gerais sobre a campanha de 1863. Mas aqui, não mais números ambiciosos! Ele os evita, e não sem motivos!... O Sr. Kardec contenta-se em anunciar que o Espiritismo está sempre florescente, mais florescente do que nunca! Como provas de apoio, cita a criação de dois novos órgãos da escola, o Ruche, de Bordeaux e o La Vérité de Lyon, sobretudo o Vérité que, diz ele, veio postar-se como atleta temível, por seus artigos de uma lógica tão serrada, que não dão lugar à crítica. Espero, senhores, demonstrar-vos, sexta-feira, que o La Vérité não é tão terrível quanto pretendem.

“É fácil ao Sr. Allan Kardec fazer esta afirmação: O Espiritismo está mais forte do que nunca, e citar como principal prova a criação do Ruche e do La Vérité! Senhores, tudo comédia!... Esses dois jornais não podem existir sem que se deva concluir que o Espiritismo deu um passo à frente? Se me objetardes que esses jornais têm despesas e que para pagá-las há necessidade de assinantes ou de impor sacrifícios esmagadores, ainda responderei: Comédia!... A caixa do Sr. Allan Kardec é bem fornida, ao que dizem. Não é justo e racional que ele ajude os seus discípulos?”

O redator do Vérité, Sr. Edoux, junta a essa citação a nota seguinte: “À saída do curso, tivemos ligeira conversa com o Padre Barricand que, aliás, nos recebeu de maneira muito cortês. Nosso objetivo era oferecer-lhe uma coleção do Vérité, para facilitar-lhe meios de falar dele à vontade.”

Veremos se o Sr. Barricand será mais feliz que seus confrades e se encontrará o que tantos outros buscaram inutilmente: argumentos esmagadores contra o Espiritismo. Mas, tanto trabalho para quê, se ele está morrendo? Considerando-se que o Padre Barricand acredita nisto, deixemos-lhe essa doce crença, pois ela não será nem mais nem menos. Não temos interesse nenhum em dissuadi-lo. Apenas diremos que se ele não tem motivos mais sérios do que aqueles que ele destaca, suas razões não são nada concludentes, e se todos os seus argumentos contra o Espiritismo têm a mesma força, podemos dormir tranquilos.

Pode-se ficar pasmo ao ver um homem sério tirar consequências tão levianas de uma viagem que fizemos no ano passado, e se imiscua em nossos atos particulares, presumindo o pensamento que deve ter-nos motivado a viajar ou deixar de fazê-lo. De uma suposição ele tira uma consequência absoluta, o que não é lógica rigorosa, porque, se as premissas não forem certas, a conclusão não o será. Direis que isto não é responder, mas não temos intenção de satisfazer à curiosidade de quem quer que seja. O Espiritismo é uma questão humanitária. Seu futuro está nas mãos de Deus, e não depende de tal ou qual manobra de um homem. Lamentamos que o Padre Barricand o veja de um ponto de vista tão limitado.

Quanto a saber se nossa caixa está bem ou mal suprida, parece-nos que é dar palpite quanto ao que existe no bolso de alguém que não deu o direito de examinálo, o que poderia passar por indiscrição. Transformar isto em informação pública é violação da vida privada. Supor o uso que alguém deva ter feito do que se supõe que ele possua, conforme as circunstâncias, pode ultrapassar as raias da calúnia.

Parece que o sistema do Sr. Barricand é proceder por suposições e por insinuações. Com tal sistema pode-se expor a receber desmentidos. Ora, nós lhe damos um formal a respeito de todas as alegações, suposições e deduções acima referidas. Discuti quanto quiserdes os princípios do Espiritismo, mas o que fazemos ou não fazemos, o que temos ou não temos, está fora de questão. Um curso não é uma diatribe, é uma exposição séria, completa e conscienciosa do assunto de que se trata. Se for contraditório, a lealdade quer argumentos pró ou contra, a fim de que o público julgue de seu valor recíproco. Às provas é preciso opor provas mais preponderantes. É dar uma pobre ideia da força de seus próprios argumentos procurar lançar o descrédito sobre as pessoas. Eis como compreendemos um curso, sobretudo da parte de um professor de teologia que, antes de tudo, deve procurar a verdade.

Bordeaux também tem seu curso público de Espiritismo, isto é, contra o Espiritismo, pelo Padre Delaporte, professor na faculdade de teologia daquela cidade. O Ruche o anuncia nestes termos:

“Quarta-feira última, dia 13 deste mês, assistimos ao curso público do dogma, no qual o Padre Delaporte tratava do seguinte assunto: Da hipótese de uma nova religião revelada pelos Espíritos, ou o Espiritismo. Não tendo ainda concluído o ilustre professor, seguiremos, atentos, suas lições, e delas daremos conta com a imparcialidade e a moderação de que jamais se deve separar um espírita.”

Nos seus números de 17 e 24 de abril, o Sauveur des peuples relata as duas primeiras lições e delas faz uma crítica séria e cerrada, que não deve deixar de causar alguns embaraços ao orador. Assim, eis dois professores de teologia de incontestável talento que, nos dois principais centros do Espiritismo na França, empreendem contra ele uma nova guerra, e se acham engalfinhados, nos dois pontos, com campeões que têm o que lhes responder. É que hoje se encontra aquilo que era raro há alguns anos: homens que o estudaram seriamente e não temem expor-se. Que sairá daí? Um primeiro resultado inevitável: o exame mais aprofundado da questão em todo o mundo. Os que não leram, quererão ler; os que não viram, quererão ver. Um segundo resultado será o de fazer com que ele seja levado a sério por aqueles que nele ainda não veem senão mistificação, pois que os ilustres teólogos o julgam assunto de séria discussão pública. Enfim um terceiro resultado será calar o medo do ridículo que ainda segura muita gente. Quando uma coisa é discutida publicamente por homens de valor, pró e contra, não se tem mais receio de falar dela.

Da cátedra religiosa, a discussão passará logo e seriamente para a cátedra científica e filosófica. Essa discussão pelo escol da inteligência terá por efeito esgotar os argumentos contraditórios, que não poderão resistir à evidência dos fatos.

Sem dúvida, a ideia espírita está muito atrapalhada, mas, pode-se dizer que ela ainda está na condição de opinião individual. O que hoje se passa tende a lhe dar aceitação na opinião geral e lhe assinalará, em breve, um lugar oficial entre as crenças aceitas.

Aproveitamos com satisfação o momento que se nos oferece para dirigir felicitações e encorajamento a todos os que, enfrentando o medo, tomam resolutamente em mãos a causa do Espiritismo. Somos felizes por ver seu número crescer dia a dia. Que perseverem, e verão em breve se multiplicarem os apoios ao seu redor, mas que se persuadam também que a luta não terminou e que a guerra a céu aberto não é a mais temível. O mais perigoso inimigo é o que age na sombra e frequentemente se oculta sob uma falsa máscara. Então lhes diremos: Desconfiai das aparências. Não julgueis os homens pelas palavras, mas pelos atos. Temei sobretudo as armadilhas.




Variedades

Os rumores que tinham emocionado a cidade de Poitiers cessaram completamente, conforme nos disseram, mas parece que os Espíritos barulhentos transportaram o palco de suas ações para as cercanias. Eis o que, a respeito, se lê no Pays:


“Os Espíritos batedores de Poitiers começam a fazer escola e povoam os campos vizinhos. Escrevem de Ville-au-Moine, a 24 de fevereiro, ao Courrier de la Vienne (não confundir com o Journal de la Vienne, especial para a casa de O.):

“Senhor redator,

“Há alguns dias nossa região está preocupada com a presença, em Bois-deDoeuil, de Espíritos batedores, que espalham o terror em nossos vilarejos. A casa do Sr. Perroche é seu ponto de encontro: todas as noites, entre onze horas e meia noite, o Espírito se manifesta por nove, onze ou treze pancadas, marcadas por duas e uma e às seis da manhã, pelo mesmo barulho.

“Notai, senhor, que os golpes são dados à cabeceira de uma cama onde se deita uma senhora, semimorta de pavor, que afirma que recebe as comunicações de um tio de seu marido, falecido em nossa aldeia há um mês. É incrível. Assim, eu e vários amigos quisemos conhecer a verdade, e para isto fomos pernoitar em Bois-deDoeuil, onde testemunhamos os fatos que nos tinham contado. Vimos até balançar, no sentido longitudinal, o berço de uma criança que parecia não estar em contato com ninguém.

“A princípio rimos da coisa, mas vendo que todas as precauções tomadas para descobrir um estratagema não havia dado resultado, retiramo-nos com mais estupor que vontade de rir.

“Se o barulho continuar, a casa do Sr. Perroche não comportará os curiosos de Marsais, Priaire, Migré, Doeuil e até de Villeneuve-la-Contesse que chegam aos bandos para lá passar a noite e tentar descobrir as profundezas do mistério.

“Recebei, etc.”

Sobre tais acontecimentos faremos apenas uma curta reflexão. O Journal de la Vienne, relatando-os, tinha anunciado reiteradamente que estavam na pista do ou dos malandros, autores dessas perturbações, que não custariam a ser pilhados. Se não o conseguiram, não podem acusar a autoridade de negligência.

Como é possível que numa casa ocupada de alto a baixo por seus agentes, puderam os malandros continuar suas manobras em sua presença, sem que lhes pudessem pôr a mão? É preciso convir que eles tinham ao mesmo tempo muita audácia e muita habilidade, porquanto enfrentaram uma brigada sem serem vistos. Além disso, é preciso que esse grupo de traquinas seja muito numeroso, pois fazem as mesmas brincadeiras em diversas cidades e a anos de intervalo, sem jamais serem pilhados. Os casos da Rua des Grès e da Rua des Noyers, em Paris, das GrandesVentes, perto de Dieppe, e tantos outros, também não renderam nenhum resultado. Como é que a polícia, que possui tão grandes recursos e despista os mais hábeis e os mais astutos malfeitores, não vence alguns barulhentos? Já refletiram sobre isto?

Aliás, os fatos não são novos, como se pode ver pelo relato seguinte.


Escrevem-nos de São Petersburgo:

“Venerável mestre, tendo lido no primeiro fascículo da Revista Espírita de 1864 o caso de um Espírito batedor do século dezesseis, lembrei-me de outro, que talvez julgueis digno de um pequeno espaço em vosso jornal. Tomo-o de uma notícia sobre a vida e o caráter do Tasso, escrita pelo Sr. Suard, secretário perpétuo da classe de língua e literatura francesas e inserto na tradução da Jerusalém Libertada, publicada em 1803.

“Após dizer que os sentimentos religiosos do Tasso, exaltados em consequência de sua disposição melancólica e das infelicidades resultantes, levaram-no a persuadir-se seriamente de que era objeto das perseguições de um Espírito que derramava tudo em sua casa; roubava-lhe o dinheiro e retirava de sua mesa, diante de seus olhos, tudo quanto lhe servia, acrescenta, com o seu historiógrafo: “Eis a maneira pela qual o próprio Tasso lhe dá conta dessa perseguição:

“O irmão R... (manda ele dizer a um de seus amigos) trouxe-me duas cartas vossas, mas uma delas desapareceu assim que a li, e creio que o duende a levou, tanto mais quanto era aquela em que dele falais. É um desses prodígios dos quais tantas vezes fui testemunha no hospital, o que não permite duvidar que sejam obra de algum mágico, e tenho muitas outras provas. Hoje mesmo retirou um pão da minha frente, e outro dia um prato de frutas.”

A seguir lamenta-se dos livros e papéis que lhe roubam e acrescenta: “Os que desapareceram enquanto eu não estava aqui, podem ter sido levados por homens que, penso, têm chaves de todas as minhas caixas, de sorte que nada mais tenho que eu possa defender dos assaltos dos inimigos ou do diabo, a não ser a minha vontade, que jamais consentirá que algo me seja ensinado por ele ou seus sectários, nem a contrair familiaridade com ele ou seus magos.”

Em outra carta diz ele: “Tudo vai de mal a pior. Esse diabo, que jamais me deixava, quer eu dormisse quer passeasse, vendo que não conseguia de mim o acordo que desejava, tomou a decisão de roubar abertamente o meu dinheiro.”

“De outras vezes, continua o autor da notícia, ele julgou que a Virgem Maria lhe aparecia, e o Padre Sevassi conta que numa doença que teve na prisão, o Tasso se recomendou com tanto fervor à Santa Virgem, que ela lhe apareceu e o curou. O Tasso consagrou esse milagre num soneto.

“Continuando, o duende transformou-se num demônio mais tratável, com quem o Tasso pretendia conversar com familiaridade, e que lhe ensinava coisas maravilhosas. Contudo, pouco satisfeito com esse estranho comércio, o Tasso lhe atribuía a origem à imprudência que cometera na juventude, de compor um diálogo onde se supunha a conversar com um Espírito. “...o que eu não teria querido fazer seriamente.” acrescenta ele, “ainda que me tivesse sido possível.”

“O Sr. Suard termina o relato dizendo: “Não se pode evitar uma triste reflexão, ao pensar que foi aos trinta anos, depois de haver escrito uma obra imortal, que o infeliz foi escolhido para dar o mais deplorável exemplo de fraqueza de espírito.”

“Vós, entretanto, senhor, graças à luz do Espiritismo, podereis fazer outro julgamento, e vereis nesses fatos, tenho certeza, mais um elo na cadeia dos fenômenos espíritas que ligam os tempos antigos à época atual.”

Sem sombra de dúvida, os fatos que hoje se passam, perfeitamente verificados e explicados, provam que o Tasso podia achar-se sob o domínio de uma dessas obsessões que diariamente testemunhamos, e que nada têm de sobrenatural.

Se ele tivesse conhecido a verdadeira causa, não se teria com ela impressionado mais do que se tem sido em nossos dias, mas naquela época a ideia do diabo, dos feiticeiros e dos mágicos estava em pleno vigor, e como, longe de combatê-la, buscavam entretê-la, ela podia reagir de modo prejudicial sobre os cérebros fracos. É, pois, mais do que provável que o Tasso não era mais louco do que o são os obsedados de nossos dias, aos quais são necessários cuidados morais e não medicamentos.



Eu vos conjuro, meus filhos, em nome dos deuses de nossa pátria, a ter consideração um pelo outro, se conservardes algum desejo de me agradar, pois imagino que considereis como certo que eu não seja mais nada quando houver deixado de viver. Até agora minha alma ficou oculta aos vossos olhos, mas por suas operações reconheceríeis que ela existia.

Não notastes nem mesmo os terrores pelos quais são atormentados os homicidas pelas almas inocentes daqueles que eles levaram à morte, e que vinganças elas tomam desses ímpios? Pensais que o culto que se presta aos mortos teria sido constantemente mantido se se acreditasse que suas almas eram destituídas de todo poder? De minha parte, meus filhos, jamais pude convencer-me de que a alma, que vive enquanto está num corpo mortal, se extinga desde que dele saiu, porque vejo que é ela que vivifica esses corpos destrutíveis enquanto os habita. Também jamais me pude persuadir de que ela perca a sua faculdade de raciocinar no momento em que se separa de um corpo que não tem capacidade de raciocínio. É natural crer que a alma, então mais pura e desprendida da matéria, goze plenamente de sua inteligência. Quando um homem morre, veem-se as diversas partes que o compunham unir-se aos elementos a que pertenciam. Só a alma escapa aos olhares, quer durante sua estada no corpo, quer quando o deixa.

Sabeis que é durante o sono, imagem da morte, que mais a alma se aproxima da Divindade, e que nesse estado muitas vezes prevê o futuro, sem dúvida porque então está inteiramente livre.

Ora, se as coisas são como eu penso, e a alma sobrevive ao corpo que abandona, fazei, em respeito à minha, o que vos recomendo. Se eu não estiver errado; se a alma ficar com o corpo e morrer com ele, ao menos temei os deuses, que não morrem, que tudo veem, que tudo podem, que sustentam no Universo essa ordem imutável, inalterável, invariável cuja magnificência e majestade são inexprimíveis.

Que esse temor vos preserve de toda ação, de todo pensamento que fira a piedade ou a justiça... Mas eu sinto que minha alma me abandona; sinto-o pelos sintomas que de ordinário anunciam a nossa dissolução.


OBSERVAÇÃO: Bem pouco teria um espírita a acrescentar a essas notáveis palavras, dignas de um filósofo cristão, nas quais se acham admiravelmente descritos os atributos especiais do corpo e da alma: o corpo material, destrutível, cujos elementos se dispersam para unir-se aos elementos similares e que, durante a vida, só age por impulsão do princípio inteligente; depois a alma, sobrevivendo ao corpo, conservando sua individualidade e gozando maiores percepções quando desprendida da matéria; a liberdade da alma durante o sono; enfim a ação da alma dos mortos sobre os vivos.

Pode-se ainda notar a distinção feita entre os deuses e a Divindade propriamente dita. Os deuses nada mais eram que os Espíritos em vários graus de elevação, encarregados de presidir, cada um na sua especialidade, todas as coisas deste mundo, na ordem moral e na material. Os deuses da pátria eram os Espíritos protetores da pátria, como os deuses lares eram os protetores da família. Os deuses, ou Espíritos superiores, não se comunicavam com os homens senão por meio de Espíritos subalternos, chamados demônios.

O vulgo não ia além, mas os filósofos e os iniciados reconheciam um Ser Supremo, criador e ordenador de todas as coisas.


A GUERRA AO DIABO E AO INFERNO, a inabilidade do diabo, o diabo convertido; por Jean de la Veuze. Brochura in-18, preço 1 franco. ─ Bordeaux, Ferrei, livreiro. ─ Paris, Didier & Cia. Quai des Augustins, 35; Ledoyen, PalaisRoyal.

Partindo do princípio que o Espiritismo é uma concepção do diabo com o objetivo de atrair para si maior número de almas, o autor traça-lhe um rápido esboço, desde as manifestações da América até os nossos dias, e mostra que o diabo errou os cálculos, pois salva as almas que estavam perdidas e desastradamente deixa escaparem as que eram suas. Vendo isto, ele se converteu, bem como uma parte de seus acólitos. É uma crítica espirituosa e alegre do papel que fazem o diabo representar nos últimos tempos, mas da qual ressaltam, através de um tom chistoso, pensamentos sérios e profundos, e perfeita justeza.

Não duvidamos que o livrinho seja lido com prazer por muita gente.

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CARTAS AOS IGNORANTES, filosofia do bom-senso, por V. Tournier. Brochura in-18, preço 1 franco. Dentu, Palais-Royal.

Espírita fervoroso e esclarecido, o autor reproduziu em versos os princípios fundamentais da Doutrina Espírita conforme o Livro dos Espíritos.

Felicitamo-lo sinceramente pela intenção que presidiu ao seu trabalho. Sob qualquer forma que a doutrina se apresente, é sempre um indício da vulgarização da ideia, e outras tantas sementes espalhadas que frutificam mais ou menos, segundo a forma que as reveste. O essencial é que o fundo seja exato, como é o caso.




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